domingo, 23 de setembro de 2007

Doze homens e uma sentença - um bom começo

Penso que as primeiras discussões que nortearam os registros que deveríamos fazer neste blog começaram com o filme: Doze homens e uma sentença e, a partir dele, a reflexão sobre os conceitos de 'evidência' e de 'argumentação'. Por essa razão, gostaria de aproveitar este espaço para trazer as reflexões que fiz no fórum com relação ao filme e a estas noções.

Certamente, ao pensarmos em exemplos de evidência e de argumentação, tivemos de refletir sobre o significado dessas duas noções, já que o filme desestabiliza o conceito que, em geral, atribuímos à idéia de evidência. À noção de evidência podemos associar a de verdade, de algo incontestável, óbvio. No filme, no entanto, a discussão entre os jurados, ao proporcionar o questionamento dos fatos, desfaz a própria evidência. Assim, a evidência se constitui como um "efeito de verdade" que pode ser desmentido sempre que alguém puder analisá-la além da superficialidade. Pensando desse modo, podemos dizer que a evidência é, na verdade, um ponto de vista, e este só se mantêm por que há um discurso (argumentação) que o sustenta como verdade incontestável. No filme, os fatos apresentados ao juiz e aos jurados foram tomados como evidentes, ou seja, o discurso das testemunhas adquiriu o status de verdade, até o momento em que um dos jurados decidiu questionar os fatos, e aqui é importante destacar que ele não apenas refutou, mas argumentou, e, desse modo, conseguiu fazer com que os demais jurados tivessem um outro olhar sobre os fatos. Ao final de tantos argumentos, discussões, reflexões, construiu-se novamente uma evidência, embora totalmente oposta a primeira, o que revela o caráter sempre provisório, movente e contestável de uma evidência.
Voltei ao fórum para discutir sobre uma questão que me chamou a atenção no filme e que, penso, tem relação com as noções de evidência e de argumentação. Um dos jurados, em certo momento do filme, disse o seguinte: "O preconceito obscurece a verdade". Ao tomar a idéia de preconceito, nesta situação, penso não em sua acepção negativa, ligada à discriminação, mas na idéia de pré-conceito, ou seja, como algo que existe antes, que é anterior, e que determina o 'agora'. Vou tentar explicar melhor. Todos nós temos uma história pessoal (individual, intransferível) que inclui nossas experiências, vivências, leituras, etc. que, ao longo de nossa vida, vão construindo nossa maneira de pensar e de compreender o mundo. Desse modo, vamos construindo nossas próprias verdades e o que vemos e pensamos é, para nós, sempre uma evidência. No filme, por exemplo, um dos jurados usava como argumento para condenar o réu o fato de ele ser pobre e morar numa favela, o que segundo o jurado era uma verdade incontestável. Outro jurado, porém, ao falar de sua própria vida, desconstruiu esse argumento de seu colega. Portanto, em tudo o que dizemos e pensamos, no modo como compreendemos cada acontecimento, há sempre algo que fala antes, um pré-conceito, um pré-construído. Por essa razão, é importante que exercitemos a 'alteridade' e nos coloquemos sempre no lugar do outro, tentando pensar como um outro pensaria, faria, diria... para sempre duvidar... mesmo quando tudo parece tão evidente.